ANDRE FORINE

O empreendedorismo pode ser de Esquerda

A esquerda brasileira precisa perder o preconceito pseudomarxista com o empreendedorismo

Por Diego Zeidan em 28/10/2024 às 20:22:30

A esquerda brasileira precisa perder o preconceito pseudomarxista com o empreendedorismo. Uma grande parcela da classe C que ascendeu socialmente durante o primeiro governo Lula procurou melhorar de vida através do empreendedorismo e de fontes de renda alternativas ao trabalho formal de carteira assinada. Essa discussão não é simples, pois não podemos cometer o erro de cair no discurso fácil de glamourização da pobreza travestida de empreendedorismo popular que ganhou muito força com a chamada "uberização" e com os casos de "superação" de quem passa mais de 12 horas por dia trabalhando na rua pra sustentar a família de forma precária. Mas é exatamente por esses casos que a esquerda precisa entrar no tema do empreendedorismo e não deixar ele ser pauta apenas da direita neoliberal que acredita no self made man americano.

Foi durante o governo Lula que foi aprovada toda a regulamentação das Micro Empresas Individuais, os MEIs, que cresceu muito o número de micro e pequenas empresas. Foi exatamente essa parcela que conseguiu ascender socialmente, comprar um carro, melhorar de casa e de qualidade de vida e, muitas vezes também montar seu negócio e aumentar a renda da família que em grande parte apoiou o Golpe contra a Dilma e a eleição de Bolsonaro. Uma parcela despolitizada da população, com quem a esquerda nunca dialogou por estar distante do tema do empreendedorismo, passou a se achar patrão e a defender o fim dos seus próprios direitos adquiridos. Muitas vezes com os filhos estudando no ProUni, sendo beneficiário direto ou indireto do Bolsa Família (indireto pois o pequeno comércio do Brasil inteiro também recebe uma injeção no faturamento por conta do programa, vide pesquisa do IPEA que comprova que cada real investido no Bolsa Família viram 3 reais de incremento no PIB), usando o SUS e usufruindo das politicas de financiamento fácil dos bancos públicos e da redução da taxa de juros do Governo Lula, essa nova classe média passou a se identificar com o discurso do Estado mínimo e da redução de impostos e de direitos trabalhistas.

Não podemos cometer o mesmo erro duas vezes. É necessário construir um caminho para o empreendedor, mas não o caminho tradicional, neoliberal, que flerta com o individualismo, com a competitividade e com a narrativa do homem que faz sucesso sozinho, o self-made-man. O empreendedor, principalmente o pequeno e o micro, precisa de incentivo do Estado. De consultoria, de formação, de acompanhamento, de facilidades de legalização, de impostos mais baixos e, principalmente, de crédito. Mas também é preciso construir o conceito de empreendedorismo popular, coletivo, bebendo da solidariedade das periferias, onde todos se ajudam, das redes de produção, consumo e comercialização e do já amplamente conhecido cooperativismo; A Economia Solidária, de Paul Singer, é uma fonte de inspiração, mas as experiencias das favelas também têm que ser levadas em consideração, como a CUFA e todo seu ecossistema de empresas e projetos sociais. Há também o conceito de empresa social e de empreendedorismo social de Muhammad Yunnus e seu Banco Grammen, que deu origens aos Bancos Comunitários no Brasil, que hoje são mais de 150 e possuem os exemplos marcantes do Banco Palmas em Fortaleza e do Banco Mumbuca em Maricá.

Todas essas experiências servem de apoio teórico e prático para a construção desse novo conceito de empreendedorismo. São ferramentas que devem ser utilizadas e financiadas pelo governo para que se amplie as oportunidades para o povo empreender dentro dessa lógica coletiva. O fenômeno da uberização e do precariado que trabalha nas ruas da cidade traz a visão das relações de trabalho de uma nova geração que não quer passar a vida toda no mesmo emprego estável e de carteira assinada, mas não tem as ferramentas e nem o capital intelectual e financeiro pra iniciar um negócio. Portanto, órgão públicos e entidades sociais localizadas na ponta como Sebrae, Correios, Caixa Econômica, Prefeituras e até os Bancos Comunitários precisam ter essa visão política e estratégica. Toda favela e periferia é viva em comércio e em empreendedorismo. Ter essa perspectiva de um empreendedorismo popular, pautado pela economia solidária, pela cooperação e pelas redes de produção e comercialização é o caminho para não termos um povo despolitizado quando ascender socialmente e melhorar de vida.


Fonte: BRASIL 247

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